quinta-feira, 12 de junho de 2014

lambarices

Disseste-me, um dia, devagar

Disseste-me, um dia, devagar -
porque as coisas óbvias
levam o seu tempo -
que não existiria nenhum dia,
por mais pequeno que fosse
que a terra não pudesse devorar.

Tu choravas, como sempre fizeste
quando vias os outros nascer.

Quando te pariu, apesar disso,
a tua mãe enxugou-te exausta
com pena de teres vindo ao mundo,
assim como estavas. Ou nua.

Hoje quando me falas a tua nudez
envelheceu. Tornou-se minha,
partilhada ou desentendida
como as árvores que caem.

E porque espero eu que ainda digas,
passado todo este tempo,
que não sabes do que falo?

Um dia haverei de descobrir,
cedo demais, imagino,
que a tua pessoa não tem sítio,
e é quase mais certa do que eu.

Por isso, não me engano,
se te digo que quando te calas
sei que um dia e uma noite
são o mesmo deus.


Pedro Braga Falcão, Poesia

Sem comentários:

Enviar um comentário