segunda-feira, 28 de abril de 2014

até um dia

soneto do amor e da morte

quando eu morrer murmura esta canção
que escrevo para ti. quando eu morrer
fica junto de mim, não queiras ver
as aves pardas do anoitecer
a revoar na minha solidão.

quando eu morrer segura a minha mão,
põe os olhos nos meus se puder ser,
se inda neles a luz esmorecer,
e diz do nosso amor como se não

tivesse de acabar, sempre a doer,
sempre a doer de tanta perfeição
que ao deixar de bater-me o coração
fique por nós o teu inda a bater,
quando eu morrer segura a minha mão.


Vasco Graça Moura, 3 Janeiro 1942 - 27 Abril 2014.

segunda-feira, 21 de abril de 2014

doping



I wanted everybody else in the world to know
(Ooh ooh ooh ooh)
I wanted everyone to know that you're the girl for me


Lord Huron - Time To Run

amor & coisas simples

“It was love at first sight, at last sight, at ever and ever sight.”

Vladimir Nabokov, Lolita.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

segunda-feira, 14 de abril de 2014

resumos

Um filme,



Que é uma música,



Tom Jobim & Elis Regina - Águas de Março

Que também é um poema,

me gustaría ser un nido si fueras un pajarito
me gustaría ser una bufanda si fueras un cuello y tuvieras frío
si fueras música yo sería un oído
si fueras agua yo sería un vaso
si fueras luz yo sería un ojo
si fueras pie yo sería un calcetín
si fueras el mar yo sería una playa
y si fueras todavía el mar yo sería un pez
y nadaría por ti
y si fueras el mar yo sería sal
y si yo fuera sal
tú serías una lechuga
una palta o al menos un huevo frito
y si tú fueras un huevo frito
yo sería un pedazo de pan
y si yo fuera un pedazo de pan
tú serías mantequilla o mermelada
y si tú fueras mermelada
yo sería el durazno de la mermelada
y si yo fuera un durazno
tú serías un árbol
y si tú fueras un árbol
yo sería tu savia y correría
por tus brazos como sangre
y si yo fuera sangre
viviría en tu corazón.


Claudio Bertoni,

Que são por sua vez um resumo, muito pequenino, daquilo que é um fim-de-semana,

Que é, por sua vez, uma ínfima parte daquilo que é toda uma vida repleta de coisas boas.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

doping & coisas simples



Disclosure - You & Me (Flume Remix)

GPOYG(irlfriend)

Phenomenal woman

Pretty women wonder where my secret lies.
I’m not cute or built to suit a fashion model’s size
But when I start to tell them,
They think I’m telling lies.
I say,
It’s in the reach of my arms,
The span of my hips,
The stride of my step,
The curl of my lips.
I’m a woman
Phenomenally.
Phenomenal woman,
That’s me.

I walk into a room
Just as cool as you please,
And to a man,
The fellows stand or
Fall down on their knees.
Then they swarm around me,
A hive of honey bees.
I say,
It’s the fire in my eyes,
And the flash of my teeth,
The swing in my waist,
And the joy in my feet.
I’m a woman
Phenomenally.

Phenomenal woman,
That’s me.

Men themselves have wondered
What they see in me.
They try so much
But they can’t touch
My inner mystery.
When I try to show them,
They say they still can’t see.
I say,
It’s in the arch of my back,
The sun of my smile,
The ride of my breasts,
The grace of my style.
I’m a woman
Phenomenally.
Phenomenal woman,
That’s me.

Now you understand
Just why my head’s not bowed.
I don’t shout or jump about
Or have to talk real loud.
When you see me passing,
It ought to make you proud.
I say,
It’s in the click of my heels,
The bend of my hair,
the palm of my hand,
The need for my care.
’Cause I’m a woman
Phenomenally.
Phenomenal woman,
That’s me.


Maya Angelou

segunda-feira, 7 de abril de 2014

doping



Warpaint - Keep It Healthy

amor & coisas simples

É Isto o Amor

Em quem pensar, agora, senão em ti? Tu, que
me esvaziaste de coisas incertas, e trouxeste a
manhã da minha noite. É verdade que te podia
dizer: «Como é mais fácil deixar que as coisas
não mudem, sermos o que sempre fomos, mudarmos
apenas dentro de nós próprios?» Mas ensinaste-me
a sermos dois; e a ser contigo aquilo que sou,
até sermos um apenas no amor que nos une,
contra a solidão que nos divide. Mas é isto o amor:
ver-te mesmo quando te não vejo, ouvir a tua
voz que abre as fontes de todos os rios, mesmo
esse que mal corria quando por ele passámos,
subindo a margem em que descobri o sentido
de irmos contra o tempo, para ganhar o tempo
que o tempo nos rouba. Como gosto, meu amor,
de chegar antes de ti para te ver chegar: com
a surpresa dos teus cabelos, e o teu rosto de água
fresca que eu bebo, com esta sede que não passa. Tu:
a primavera luminosa da minha expectativa,
a mais certa certeza de que gosto de ti, como
gostas de mim, até ao fim do mundo que me deste.


Nuno Júdice, "Pedro, Lembrando Inês"

sexta-feira, 4 de abril de 2014

amores & bons fins-de-semana



I am thinking it’s a sign
That the freckles in our eyes
Are mirror images and when we kiss
They’re perfectly aligned


Iron and Wine - Such great Heights

coisas simples

Sobre o Caminho

Nada

nem o branco fogo do trigo
nem as agulhas cravadas na pupila dos pássaros
te dirão a palavra

Não interrogues não perguntes
entre a razão e a turbulência da neve
não há diferença

Não colecciones dejectos o teu destino és tu

Despe-te
não há outro caminho


Eugénio de Andrade, Véspera da Água

lambarices



Lost in Translation, Sofia Coppola

N.B. - especial agradecimento ao grande Jô.

o Mourinha é o maior

A vida dela não dá um filme

Sei Lá
De: Joaquim Leitão
Com: Leonor Seixas, Rita Pereira, Pedro Granger, Rui Unas, Tino Navarro, António Pedro Cerdeira, Paula Lobo Antunes
Género: comédia romântica
Classificação: M/12
Avaliação: mau

Há uma razão para começar a falar de Sei Lá pegando em Panic, a canção dos Smiths em que o vocalista e letrista Morrissey cantava “the music that they constantly play / it says nothing to me about my life.” O que é que, em 2014, Sei Lá diz ao espectador português médio? A adaptação do best-seller de Margarida Rebelo Pinto não tem de dizer nada. Como diz uma das personagens - Rui Unas, o oleoso editor da revista de sociedade onde a heroína Leonor Seixas trabalha - “não estamos aqui para esclarecer, estamos aqui para entreter.” Não há nada de mal nisso, há maus filmes de esclarecimento e bons filmes de entretenimento.

Ou antes: não haveria nada de mal nisso, se, 15 anos depois da publicação do livro, Sei Lá não estreasse num país empobrecido, no meio de uma recessão brutal e de uma política de austeridade que veio alargar o fosso entre “ricos” e “pobres”. Hoje, em plena falência moral e social da “sociedade dos famosos” que se tornou num pobrezinho “ópio do povo” alimentado pela televisão, esta versão extemporânea e rasteira de Sexo e a Cidade sobre os dilemas românticos de quatro amigas “bem na vida” balança entre o escapismo fútil do conto-de-fadas e a banalidade preto-no-branco de uma telenovela onde tudo se resolve a tempo de um final feliz. A vida real não é assim - nem os filmes têm obrigação de ser como a vida real. Mas acreditar que as pessoas “engolem” sem pestanejar uma fantasia irreal, pontualmente risível, sobre uma jornalista de sociedade apaixonada por um espanhol misterioso (que na verdade é terrorista basco) e seduzida por um lisboeta misterioso (que na verdade é agente do SIS), cheia de pessoas bonitas e sítios bonitos e caras conhecidas da TV, corre o risco de dizer muito mais sobre quem o fez e sobre a ideia que tem do país em que vive.

Não basta fazer uma festa de sociedade no grande ecrã para fazer um filme - apesar do profissionalismo consumado de Joaquim Leitão (que atinge aqui o grau zero do tarefeirismo, dirigindo com correcção mas sem o mínimo de convicção ou entrega). A diferença entre Sei Lá, uma telenovela ou um magazine de sociedade, para lá do ecrã panorâmico, é inexistente. Não chega dar às pessoas televisão em ecrã grande para se fazer cinema - o escuro da sala de cinema amplifica e sublinha falhas que num ecrã pequeno, num ambiente caseiro onde nem sempre prestamos a mesma atenção, seriam vistas com outra benevolência. É por aqui que se percebe a inexplicável falta de jeito que sempre tivemos para o cinema “de grande público” (apesar de bons esforços pontuais, alguns dos quais assinados pelo próprio Joaquim Leitão ou por António-Pedro Vasconcelos, por exemplo).

Longe de nós negar o valor que o livro de Margarida Rebelo Pinto pode ter tido (enquanto retrato mais do que enquanto literatura). Mas o filme, com a sua colagem ostensiva a Sexo e a Cidade (que, aqui entre nós, também nunca deveria ter saltado para o grande ecrã), surge fora de tempo, ancorado em todos os lugares-comuns de uma fórmula “cor-de-rosa” que não faz sentido fora dos “horizontes curtos” do pequeno ecrã. É verdade, isto é apenas um entretenimento. Mas é um entretenimento bastante esclarecedor sobre o país em que vivemos - onde a cultura é tratada, condescendentemente, como uma coisa de “intelectuais” mas se acha que futilidades inanes (e igualmente condescendentes) como esta é o que preciso fazer para “chegar ao público”. Cada um que tire as suas conclusões.


Aqui.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

para (literalmente) dormir de um sono só



Jamie xx - Sleep Sound

não estou só

B São Mamede, os estóicos do Príncipe Real.

O que mais adoro observar nestes tempos de crise é ver o pulsar dos que se reinventam. E no Príncipe Real há uma dupla que dá asas à criatividade. Chamo-lhes os estoicos do Príncipe Real.
José Luis Barbosa e Leonor Barata não têm ideias a medir no que toca à reinvenção. Quem não se lembra do Palácio onde respirava a Empório Casa. Percursores de uma vibração que não era habitual na Lisboa de há dez anos, o casal nunca teve medo de arriscar e pensar grande. O génio singular de José Luís e a simpatia luminosa de Leonor Barata habituaram-nos mal e confesso que tenho muitas saudades da Empório. Mas mais do que as saudades dou muito valor à realidade e o José Luis e a Leonor nunca foram de se deixarem iludir pela mudança dos tempos. E exemplos como este garantem a qualidade e muito mundo na nossa cidade.
Não tempos por agora uma Empório, mas são três as lojas do Príncipe Real que oferecendo linhas diferentes marcam um estilo muito próprio nas escolhas longe das Inditex’s da vida. Nada contra o empório espanhol que permitiu que os portugueses passassem a estar mais alinhados com as tendências internacionais, mas uma cidade precisa de diferença e personalidade e nisso o José Luis e a Leonor fazem-no como ninguém.
A B São Mamede, é a terceira morada que abriram nos últimos três anos, após o regresso de José Luís à moda, depois de anos de interrupção passados no design e arquitetura de Interiores, como aconteceu na Arquitectónica (onde renasce esta loja) e na Empório Casa.
Como uma das esquinas mais emblemáticas da cidade e do Príncipe Real, Leonor e José Luís Barbosa à semelhança do que já acontecera com as lojas B Bazar e Espaço B, pesquisaram e selecionaram novas marcas de criadores emergentes, com o intuito de diversificar a oferta já existente nas suas outras lojas, destinada a mulheres que procuram um estilo pessoal alternativo, elegante, sofisticado e original, e que não se revêm em tendências da moda da massificada.
Além de vestuário, calçado e acessórios provenientes de vários países como Itália, Bélgica, Suécia, França, Alemanha, entre outros, pode-se ainda encontrar neste novo espaço os perfumes da exclusiva marca Francesa, Histoires de Parfums e aromas selecionados da Comme des Garçons.
É uma escolha do mundo para portugueses do mundo, além de um enorme testemunho do que significa a palavra criatividade nos dias que correm. Por mais amor que tenhamos aos negócios é urgente seguir testemunhos de realidade como este, que nunca deixou de acreditar no comércio de rua num dos bairros de excelência da capital, e que apesar dos tempos de mudança nunca baixaram os braços. Então, são ou não são os estoicos do Príncipe Real?

crónica Saída de Emergência publicada na Vogue online a 18 de Outubro de 2012


Aqui.

N.B. - especial agradecimento à Mais-que-Tudo.